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Entre os ingredientes do conflito que aterroriza Uganda, uma milícia que recruta à força para impor a Bíblia e as velhas disputas tribais atiçadas pela colonização
- (27/07/2007)
Cinco, vinte ou cem mil mortes? Em mais de vinte anos, não se tem estimativa confiável do número de vítimas da guerra do norte de Uganda. Desde 1986, com o início da rebelião de Alice Lakwena, a região nunca mais teve paz. Derrotado às portas de Kampala, em novembro de 1987, o Movimento do Espírito Santo (Holy Spirit Movement) foi, rapidamente, substituído pelo Exército de Resistência do Senhor (ERS ou Lord’ s Resistance Army, LRA), dirigido por Joseph Kony, sobrinho de Lakwena. Ambos acreditam que são dirigidos pelo espírito santo e propõem a imposição de um poder baseado nos Dez Mandamentos [1].
O conflito reflete, também, a profunda rivalidade entre o sul do país, detentor do poder, e o norte, que se considera excluído. Essas tensões remontam à colonização britânica, que as intensificou por meio de um jogo de poder regional. O ERS beneficia-se do apoio do povo acholi (norte do Uganda), que se opõe ao presidente Yoweri Museveni, procedente da tribo dos bayankolés (sudoeste do país). Em 1986, o chefe de Estado tomou o poder e derrubou um conselho militar acholi. Até há pouco, o ERS recebia favores do vizinho Sudão. Kartum servia-se da milícia em seu próprio conflito contra os rebeldes sulistas.
Em 1996, frente ao terror promovido pelo ERS no norte de Uganda, o governo decidiu criar “campos protegidos” para a população. Procurou, também, privar os rebeldes de suas fontes de abastecimento. Mas fracassou. Os massacres de civis prosseguem, e certos atos de mutilação lembram os praticados na guerra de Serra Leoa. Entre 25 e 60 mil crianças foram raptadas e transformadas em soldados do ERS. Milhares de pessoas foram obrigadas a deixar os campos à noite para se esconder dos “recrutadores” nas ruas de Gulu e outras cidades do norte do país. Haveria 1,5 milhão de pessoas deslocadas na região acholi — local mais deavstado pelo conflito. O ugandense Michael Odongior, conselheiro jurídico de uma associação local, faz uma constatação desiludida: “aqui as pessoas sobrevivem graças à ajuda humanitária internacional. A presença do governo resume-se ao exército e a algumas estradas construídas há muito tempo”.
Tradução: Marcelo de Valécio
marlivre@gmail.com
[1] Ler Michel Arseneault, “La folle guerre de l’Armée de résistance du Seigneur”, Le Monde diplomatique, edição francesa, fevereiro de 1998.