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O jornalista Charles Enderlin estruturou seu documentário (“O sonho despedaçado”) a partir das entrevistas com os principais atores do fracassado acordo de Oslo, realizadas ao mesmo tempo em que acontecia essa lenta descida aos infernos
- (01/11/2002)
O programa que o canal de televisão France 2 apresentou a seus telespectadores nos dias 3 e 4 de novembro, na segunda parte da programação noturna – infelizmente –, não foi um documentário como um outro qualquer. Correspondente desse canal há mais de vinte anos em Jerusalém, Charles Enderlin estruturou “Le Rêve brisé” (“O sonho despedaçado”) – como o livro epônimo1 – a partir das entrevistas com os principais atores do fracassado acordo de Oslo, realizadas ao mesmo tempo em que acontecia essa lenta descida aos infernos2.
Graças a esses depoimentos, tão equilibrados quanto indiscutíveis, o jornalista não se contenta em relatar os acontecimentos: contribui para explicá-los. E essa explicação não confirma – é um eufemismo – a tese dos dirigentes israelenses, tanto trabalhistas como “likudistas”, quer se trate dos anos de Oslo, da cúpula de Camp David, da irrupção da segunda Intifada ou das negociações de Taba.
“Le Rêve brisé” nos lembra utilmente que o terrorismo abalou profundamente a paz – do assassinato de Itzhak Rabin aos atentados suicidas. Mas essa paz desde então já estava atingida em seu âmago pelo prosseguimento da colonização e o adiamento das retiradas israelenses, bem como das negociações sobre o estatuto final. Só é lamentável que, enfocando os projetores “do alto”, o documentário talvez passe um pouco depressa demais sobre a percepção que tiveram os palestinos, “de baixo”, dessa sabotagem.
A lenda da “oferta generosa” de Ehud Barak prejudicada pela “intransigência” de Yasser Arafat pouco resiste à narrativa de Camp David. Pois, como é enfatizado no filme, Barak dramatizou voluntariamente essa etapa de uma negociação a que Arafat pretendia dar prosseguimento. Da mesma forma, é a renúncia do primeiro-ministro israelense3, no início de dezembro de 2000, o que condena negociações que quase seriam bem sucedidas em janeiro, em Taba, tendo por base “parâmetros” sugeridos pouco antes pelo presidente William Clinton.
Ao que tudo indica, a verdadeira revelação do filme refere-se a esse último ponto. Numa autocrítica de grande repercussão, Dennis Ross, coordenador do Departamento de Estado para o Oriente Médio, lamenta que seu governo não tenha explicitado, desde o final de setembro de 2000, as novas propostas norte-americanas. E se israelenses e palestinos pudessem ter sido poupados da escalada da repressão, da “militarização” da Intifada, da eleição de Ariel Sharon e da reocupação violenta da Cisjordânia?
(Trad.: Regina Salgado Campos)
* Secretário de redação de Le Monde diplomatique.
1 - Le Rêve brisé, Fayard, 2002. Ler a esse respeito: Alain Gresh, "Uma paz despedaçada?", Le Monde diplomatique, julho de 2002.
2 - Intervêm sobretudo, do lado palestino: Yasser Arafat, Marwan Barghouty, Yasser Abed Rabbo e Saeb Erekat; do lado israelense: Ehud Barak, Benyamin Netanyahou e Shimon Peres; do lado norte-americano, Madeleine Albright e Dennis Ross.
3 - O filme não especifica, mas é importante observar que nada nas leis orgânicas nem nos costumes políticos israelenses obrigava Barak a essa demissão; ele poderia ter se mantido em suas funções por vários meses, ter negociado o acordo com os palestinos e ter defendido tal acordo - provavelmente com sucesso - junto a seus eleitores.